sexta-feira, 22 de junho de 2012

Fundações: Capítulos 23-24


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Ficha XI.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –I 
Capítulos 23-24 

Começa o relato de uma nova fundação, a do “Mosteiro do glorioso São José del Carmen, na cidade de Sevilha”, com a primeira Missa no dia da Santíssima Trindade, 29 de Maio de 1575. A Madre interrompe a crónica com um breve retrato biográfico-espiritual do Padre Jerónimo Graciano. A finalidade histórica cede o passo à intenção pedagógica e mistagógica: aprender com os sucessos e vidas edificantes, descobrir o mistério de Deus nos acontecimentos e factos providenciais quotidianos e dá-lo a conhecer. ‘Historiar’ tudo para que permaneça sempre vivo e fresco na memória das gerações futuras.
Pistas de leitura 
1- Teresa tem as suas razões para dedicar todo um capítulo ao P. Jerónimo Graciano. Acha necessário recordar a circunstância histórica do seu encontro com ele pela situação que viviam então as comunidades de Descalços. A Providência de Deus assiste-os nas necessidades da Ordem elegendo e enviando uma pessoa ‘íntegra’ para levar para a frente a reforma (F 23,3.12-13; 24,1-2). É por isso que Graciano entra em cheio no relato. E, como novo Comissário Apostólico para Andaluzia, é quem (contrariando os desejos e projectos da Madre: F 24,4), lhe ordena levar para a frente a fundação de Sevilha. 

2- Como pano de fundo histórico, recordemos que aos avatares e exigências inerentes a toda a fundação se juntam, na de Sevilha, a desconformidade e os descontentamentos dos Calçados em relação a fundações de Descalços/as na Andaluzia (F 24 20); o desentendimento e incomunicação entre o Geral Rubeo e a Madre Teresa; e ainda a oposição do bispo Fernando de Rojas y Sandoval pela fundação de um novo mosteiro em pobreza (F 24,15-16). Com tudo isto terá de lidar a Madre nesta fundação1 


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1- Ler com atenção a descrição que Teresa faz de Graciano, a sua índole espiritual. Fazer uma lista de qualidades humanas e virtudes. Teresa pondera é o que admira. Tudo é dom do Senhor, a obra que Deus realizou na pessoa de Graciano para bem da Ordem. De tudo isso, o que é que destacaríamos? O que é que achamos mais importante ou necessário? Na nossa sociedade, na nossa realidade pastoral, quais as qualidades que hoje a Ordem exige aos carmelitas para enriquecer e comunicar o carisma herdado? 


Ficha XI.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – II 

2- No relato da vocação de Graciano, sobressai em tudo a Providência de Deus. Ele tem os seus planos, e os leva a cabo através de mediações e circunstâncias que parecem fortuitas, que escapam à consciência e à intenção inicial de Graciano: “Oh! Sabedoria e poder de Deus! Como é certo não podermos nós fugir ao que é a Sua Vontade!” (F 23,3). Como compreendemos hoje esta afirmação de Teresa? Descobrimos a Providência divina na nossa vocação, no nosso caminho de seguimento de Jesus, no discernimento da sua vontade na nossa vida? A que mediações damos valor? De quais sentimos falta? 

3- Teresa dedica vários parágrafos à presença e mediação da Virgem Maria (F 23,1-4-6.8-13). Reflecte, à luz destas afirmações, a tua própria experiência mariana. 

4- O relato das qualidades de Graciano como superior (F 23, 7.10) e a descrição da personalidade e comportamento do prior de Pastrana (23,9) revela-nos duas formas de governo: algo assim como ‘um ideal’ e uma desfiguração do ideal. - Debater o tema: as razões e as conclusões da Madre, e confrontá-las com a nossa experiência no exercício da autoridade (nas responsabilidades que nos tocam) ou com a nossa resposta teologal à autoridade que outros exercem como serviço na Igreja. 

5- Depois de longos parágrafos revelando a história e a intimidade de Graciano. Teresa justifica-se (F 23,11-13). Tem as suas razões para ‘fazer memória’ delas. - Reflectir sobre a importância da memória e do relato. Confrontá-lo com a nossa forma de compreender, viver e transmitir o carisma recebido de Deus, seja qual for o estado de vida. Pode inspirar um momento de oração e de louvor. 

6- Teresa, com espírito de fé, cede perante as exigências do novo Comissário Apostólico para a Andaluzia. Renuncia à fundação de Caravaca (contra o seu parecer, revelações particulares e desejos) e obedece a Graciano (F 24,4). Compartilhar as nossas dificuldades perante o discernimento da vontade de Deus, perante o reconhecimento e a obediência a Deus nas suas mediações. 


Ficha XI.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – III 

7- A Santa relata as fundações contando os inconvenientes ou peripécias do caminho. Fá-lo com muita vivacidade e humor (F 24,5ss). Não faltam episódios daqueles oito dias de caminho. A eles se acrescenta “mais de um mês” de espera da licença para fundar. Uma espera amassada com paciência nos dias mais duros do verão andaluz2. Mas Teresa nunca perde ocasião para tirar sempre um ensinamento, alguma aplicação à vida espiritual ou um motivo para descobrir a Providência e o próprio ser de Deus. - Quais são os que descobres nestes dois capítulos? Para meditar e partilhar: “Sua Majestade dá sempre os trabalhos com piedade” (F 24,11). 


8 - A Madre pondera as qualidades das irmãs que leva como fundadoras. A segurança e fortaleza que lhe inspira a virtude provada das suas monjas. – Somos receptivos e agradecidos para com as qualidades e virtudes dos outros? – Sentimo-nos amparados, edificados, estimulados pelos irmãos? – Sabemos compartilhar ideais, tarefas ou responsabilidades, confiando nos outros? – Que atitudes e virtudes deveríamos cultivar mais para viver a fraternidade e confiança mútua nos nossos projectos comunitários/familiares? 




1(Cf. T.ALVAREZ, Comentarios al libro de las “Fundaciones” de Santa Teresa de Jesús. Monte Carmelo, Burgos 2011, 117-121) 
2 A leitura desta fundação pode completar-se com a descrição pormenorizada e amena do P. Efrém da Mãe de Deus e O. Steggink, em Tiempo y vida de Santa Teresa, BAC, Madrid 1968, P II, nº 386-411. 




terça-feira, 19 de junho de 2012

Fundações: Capítulo 22









Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – I 

Capítulo 22 
Se Granada foi o escritório de S. João da Cruz, Toledo não o foi menos para Teresa de Jesus. Aqui, na cidade imperial, desde uma pobre cela do Carmelo, escreve o relato da sua primeira fundação em terras andaluzas: Beas de Segura, província de Jaén.
Tempos aqueles, desde esse fecundo ano de 1576, classificado por Teresa como de grandes trabalhos, até ao ponto dela crer que ser a causa de toda esta tormenta, e que se me deitassem ao mar, como Jonas, cessaria a tempestade (F 28, 5). 
Navegando neste mar tempestuoso e salva do naufrágio, porque, agora sim, está arrimada a esta forte coluna da oração (V 8,2), Teresa de Jesus recorda aquela difícil e complexa aventura fundacional que a levou a Andaluzia, sem o saber, pondo em risco a sua relação afectuosa, em breve desfeita, com o P. Geral Rubeo. 
Em Beas, teve lugar o encontro idílico com Jerónimo Graciano, personagem chave da sua Reforma. Aqui se forjou a entranhável relação mestre-discípulas, entre João da Cruz e as carmelitas de Beas, com abundância de “bilhetinhos” espirituais conservados devotamente por elas, e que hoje formam uma grande parte dos Ditos de Luz e Amor do Santo. Também em Beas, teve Teresa a sua gota de amargura: foi o lugar onde recebeu a dura notícia do sequestro do Livro da Vida nas mãos da terrível Inquisição. 

Pistas de leitura 
1- Os inconvenientes (F 22,1-2) 
- Uma viagem longa a perigosa (a passagem de Despeñaperros, Serra Morena e os altíssimos penhascos de Gualdinfierno) para uma mulher de 60 anos, de saúde frágil e em pleno inverno. 
- Uma pequena povoação, nada semelhante aos ambientes urbanos preferidos por Teresa, muito pouca renda (F 22, 19), tão longe da sua Ávila natal, para ela ponto de referência das distâncias. 
- A oposição do P. Pedro Fernández às novas fundações, foi superada surpreendentemente por outra dificuldade maior: Beas pertencia à Comenda de Santiago e era supostamente impossível conseguir a devida licença. 
Nesta ocasião, uma dificuldade ajuda a resolver a outra, e o próprio Filipe II outorga a licença ao saber que o futuro mosteiro era das descalças do Carmo (F 22,18). 
Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – II 

Algumas vezes penso nisto – dirá Teresa – e como o que Nosso Senhor quer, embora o não queiramos nós, se vem a realizar e chegamos a servir-Lhe de instrumento, mesmo sem darmos por isso, foi o que aqui aconteceu com o Padre Mestre Frei Pedro Fernández (F 22,3). 

2- “História Exemplar” de D. Catarina Godínez 
Tal como aconteceu com a fundação de Alba de Tormes, a biografia das fundadoras, ou antes, uma delas, D. Catarina, ocupa quase todo o capítulo (nn. 4-24). A Santa parece escrever valendo-se de um guião redaccional, talvez de mão alheia, onde se encontram registados os factos mais marcantes de tão extraordinária história: 
- Vida familiar de uma donzela fidalga rural; conversão e mudança de vida; práticas religiosas da jovem Catarina, agora “em hábito modesto”; oposição dos pais, doenças e luta enérgica para fundar o mosteiro, etc. 
- Encontramos no relato, momentos tão simpáticos como o do enfado ruidoso do demónio que fez sair da cama, de espada na mão e meio vestido, o bom D. Sancho. Sem dúvida que os estudantes de Medicina tirariam proveito desse “Pequeno Tratado” de História da Medicina do século XVI, escrito neste capítulo por Teresa de Jesus: todo um catálogo de doenças que formam um quadro clínico estranho e heterogéneo, juntamente com os remédios aplicados (ventosas, mais de 500 sangrias, cautérios, etc.) que demonstram a fortaleza física de D. Catarina que, apesar de tudo, foi capaz de sobreviver… 
- A chave desta história estranha e divertida encontra-se no n. 6: Teresa escreve para que todos O louvem - a Deus, certamente, verdadeiro protagonista do livro. É por isso que, no n.7, encontramos uma linda oração emocionada, com sabor evangélico: Sede bendito, ó meu Deus, para sempre, pois num momento abateis uma alma e a levantais renovada… 

3- História “Actual” da fundação (F 22,19-20) 
Apenas um par de números dedicados ao momento da fundação, tão breves que só referem o ano, 1575, da chegada das carmelitas chefiadas por Teresa no princípio da Quaresma, a alegria do povo, o nome do novo mosteiro (S. José do Salvador, fundado no dia de S. Matias) e uma breve menção da tomada de hábito das duas irmãs fundadoras, mas, isso sim, adornada com novos elogios à inigualável Catarina. 



Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –III 

Finalmente! O que Sua Majestade quer não se pode deixar de fazer (F 22,19). 

4- Apêndice (F 22, 1-24) 
O relato parece concluir no nº 20 com a frase final, mas Teresa acrescenta uma espécie de apêndice em que encontramos: 
- O modo “sobrenatural” como Catarina conhece a existência da Ordem do Carmo e a sua Regra, assim como o encontro com o jesuíta que lhe dá notícia dos nossos mosteiros (F 22, 21-22). 
- Novos pormenores da cura milagrosa (F 22, 23). 
- Virtudes de D. Catarina, já convertida em Catarina de Jesus, de quem Teresa traça com mão firme um retrato magistral: Nenhuma coisa vejo fazer a esta alma que não seja para ser agradável a Deus, e é assim com todas (F 22, 24). Prova de que “não é encarecimento” (como diria a Santa) é o testemunho deixado pelo Padre Graciano na sua Peregrinação de Anastácio, diálogo 16, pois escreve que a Madre Catarina é das maiores santas da Ordem. Por outro lado, o próprio S. João da Cruz se encarregou de transcrever de sua própria mão, o texto da sua autobiografia. 
- E, agora sim, Ámen. 

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 
1 – Lê e medita na conversão de Catarina Godínez diante do crucifixo (F 22, 5-6); compara com V 9, 1-3, onde Teresa nos conta a sua conversão ao ver uma imagem de Cristo muito chagado. 
2 – Pode ser um bom momento para pensar e partilhar com o grupo o teu encontro com Jesus e como mudou a tua vida. 
3 – Ora com Teresa, bendiz e louva o Senhor (F 22, 7) 
4 – Julgo que Nosso Senhor nunca faz a uma alma mercê tão grande, sem que outras almas dela participem (F 22, 9). 
Esta interdependência entre os membros do corpo místico de Cristo é muitas vezes apontada por Teresa em diversos textos (4M 3,10; 5M 4,6, entre outros). 
Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –IV 

Cada um de nós não anda sozinho o caminho escolhido: para bem ou para mal, arrasta outros consigo. 

- Somos conscientes desta realidade, que é uma responsabilidade muito séria? 
- Acaso o individualismo pós-moderno, que todos padecemos, nos leva a nos esquecermos da força do testemunho cristão? São Paulo diz que temos de levar as cargas uns dos outros. 
- Ter-nos-íamos deixado “contaminar”, quase sem dar por isso, da tendência laicizante que trata de se impor, segundo a qual a fé deve ser vivida no âmbito privado e estritamente pessoal? 
- É a minha oração um intimismo mais ou menos subtil? 
Recorda que Para isto é a oração, filhas minhas; para isto serve este matrimónio espiritual: que nasçam sempre obras, obras (7M 4,6). 
- Reza novamente com Teresa CC 1, nº 14; V 16, 6-7. Partilha a tua oração sobre estes textos com o grupo de oração, comunitário, paroquial, etc. 
5 – E, por fim, um pedido: 
Praza a Sua Majestade que a grandíssima liberalidade que tem tido com esta miserável pecadora sirva, de algum modo, para que se esforcem e animem os que isto lerem, a deixar tudo, de todo em todo, por Deus (V 21,12).